Será que tem? Se fora é onde estou, tem sim. E sempre haverá "eu" do outro lado desse longo muro.
Mesmo que eu pareça distante, o que não sinto muito bem que estou. Talvez esteja já que não me sinto, ou mesmo porque aquele tijolo que foi dezembro (e parece ter sido o maior de todos) caiu bem em cima do meu estômago e me fez derramar lágrimas de sangue até conseguir me recompôr.
Mas se eu preciso me lembrar dessa dor aguda todos os dias fazendo perguntas e ouvindo respostas sobre coisas que me lembram o tijolão, só pra me fazer mais presente, ok, o farei. Se não fiz ou deixei de fazer por hábito, foi por medo de ele cair outra vez, e trazer junto os vizinhos que não sei quantificar.
O ruim de se fazer só agora, é que vai parecer obediência e obrigação, quando eu já não o fazia porque esperava o livre arbítrio que espero que todos tenhamos, já que busco a vida toda por um pouquinho de liberdade.
Estou encostada no muro, pra poder ouvir melhor. Mas não devo estar falando alto o suficiente, assim parece que sou apenas o vento soprando do outro lado. Ou aquela bola de feno no deserto.
Em verdade, sonho muito com o deserto, com construções e viagens. Talvez porque seja eu quem tenha que começar algo novo, em outro lugar, mais perto. Deste lado aí.
Queria apenas quebrar dezembro em pedacinhos para ele não se fundir com os meses-tijolos circunvizinhos e transformar-se em uma parede sólida e infinitamente mais pesada porque, como disse, estou encostada no muro. Se ele cai, cai em cima de mim também.
Talvez eu deva picar tijolo por tijolo e me pendurar nos ferros, e balançá-los pra cair tudo duma vez. Como no Muro de Berlim.