27.11.11

STOP

Sorte dos primogênitos que Deus matou no Egito. Sorte desses pobres coitados não conhecerem o peso e a dor e a dilaceração que é ter que nunca errar, sempre ajudar, sempre cuidar de todo o restante da prole, sempre dar satisfação, sempre dar orgulho e presentear sempre com boa educação.
Sorte dos caçulas, dos filhos do meio, que são livres pra fazerem o que querem, que não são supervisionados 100% do tempo, que não devem nada à ninguém, que até por isso são paparicados e incentivados a serem o que são.
Sorte nada, caçula geralmente é quem não precisa aproveitar de todos esses gozos da vida, que não se importariam de cuidar de todo mundo e serem robozinhos controlados por papai e mamãe.
Quem precisa de liberdade e espaço somos nós, os mais velhos, os de alma idosa, de mente grande, de criatividade enorme e dores profundas.
A prisão que é viver em família amputa-me e castra-me todos os dias, fico doente, fico com as entranhas dilaceradas e os olhos sangrando de ter que aguentar esse cárcere, esse sadismo exacerbado, essa punição sem motivo, essa barbárie e todo esse horror. E eu aguento calada, e todos vibram por acreditarem que eu concordo com isso, então está fácil, não vão esquentar a cabeça, não é mesmo?
Mas eu quero gritar, quero quebrar, quero machucar, quero devolver toda a minha dor e minha angústia, quero escandalizar suas festas, churrascos, almoços e reuniões hipócritas e soberbas, cheias de falsos carinhos e sentimentos. Eu odeio tanto, mas tanto tudo isso! Essas risadas, esses gritos de vitória, essas comemorações vazias, essas reuniões de máscaras terríveis e assustadoras, isso dói, dói como nada mais o faz.
O que nunca te abandona e sempre estará ali pra te acolher e bendizer, não importa o que você faça, é a coisa que você quer mais distância, quer mais indiferença e desprendimento. E neste caso "você" sou eu. Sim, eu.
Eu cansei de sentir essa dor por toda a vida, porque agora me parece que ela vem toda de uma vez, todos esses dias que já vivi compactados numa dose que me vem agora a cada instante, e é muita dor de muito tempo de uma vez, eu não sei se vou aguentar, eu estou ferida demais, daqui a pouco tudo que há em mim estará jorrando sangue e coagulando e entupindo meus vasos e contraindo meus músculos, rachando ossos, inflamando-os, tudo se corta e se amputa, e eu estou morrendo.
Estou morrendo porque sou ainda uma filha da puta que não quer decepcionar ninguém, não quer magoar nem causar ataques de pânico e do coração. Não quero ver caras feias de desaprovação porque sempre me deliciei com os elogios dados. 
Se eu tivesse certeza de que não estou fazendo isso pra não ficar com má reputação pela fortaleza que se chama família, já teria agido. Mas eu tenho certa desconfiança que me preocupo sim com toda essa merda sádica que me corta em pedacinhos, queima e junta os pedaços pra fazer tudo outra vez, com mais violência.
Eu sou muito idiota. Uma idiota masoquista.

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